segunda-feira, 29 de maio de 2017

Sobre um mestrado e um sumiço

Quem me acompanha aqui sabe que fui fazer um mestrado em Portugal, país que, definitivamente, não me canso de visitar, enaltecer e amar. Após dois anos de idas e vindas, muito estudo e dedicação - mas também um mergulho caprichado na cultura lusitana, de norte a sul, com seus encantos e delícias - minha família brasileira já brinca comigo: "A Madi se tornou portuguesa", com direito a musiquinha: É uma velha portuguesa, com certeza...
"Portugas, agora somos nós que vamos invadir suas praias!" Aqui o grupo de brasileiros fazendo mestrado e doutorado na UFP e que conheci no primeiro fim-de-semana no Porto, antes de iniciar as aulas.
Eu rio da musiquinha. Entro na brincadeira e respondo ora, pois!
E sinto falta mesmo da minha "vida portuguesa", do que lá encontrei, dos amigos que fiz, das famílias que me acolheram, de tudo que vi, ouvi, provei, fiz e senti. Acima de tudo, do que aprendi, sobre o que fui estudar - meu objetivo principal - e sobre mim mesma. Uma viagem sozinha é sempre um autodescobrimento, uma forma de se conectar com seu eu mais profundo, com aquela pessoa que vc foi um dia e já nem lembra mais. Sim, nossas personas se perdem pela vida, não somem da nossa essência, mas as camadas que vamos sobrepondo, ao longo do tempo e das concessões adaptações que fazemos pra nos encaixar, vão distanciando o que fomos do que nos tornamos. Nietzsche sabia das coisas.
Admirando o rio Douro  num dos muitos deques onde se pode sentar para assistir o pôr do sol mais lindo do mundo (que, por acaso, não apareceu neste dia, estava nublado, rsss..)
Logo que cheguei ao Porto, em junho de 2015, sozinha e com aquele friozinho na barriga, de quem vai enfrentar uma situação nova, confesso que estava meio tensa. Pra ser franca, não sabia mesmo se queria fazer um mestrado, se já não era tarde pra realizar um sonho antigo, se valia a pena deixar marido e filhos no Brasil e voltar ao universo acadêmico de leituras e pesquisas, o qual eu já tinha deixado de lado desde minha especialização, em 2006/7. Sempre gostei de ler e estudar, isso é #fato, mas daí a largar meu trabalho/vida estabilizada e me mandar pra Portugal, virar aluna novamente com toda aquela rotina estressante de aulas, seminários, visitas à biblioteca, pesquisas a artigos, teses e calhamaços pra ler, recensões críticas pra escrever e aquela pressão toda pra ir bem, me pareceu um surto psicótico adolescente.
"Ô tia, onde é a seção de marketing?" -Não sei, oh pá, tb sou estudante aqui, caralho!

Provavelmente eu estava tentando postergar meus 50 (fui admitida no mestrado com 49 anos) - mas seja lá o que me levou a isso, já estava escrito. Maktube. E foi preciso coragem pra entrar na sala de aula com aqueles jovens cheios de gás, hiperconectados, atualizados e super focados. Eles tb devem ter se perguntado, o que ela faz aqui? - boa pergunta, pessoal! (na época eu não sabia, mas agora garanto: nunca é tarde!)
No primeiro dia, sentada na minha classe, tentando acompanhar a aula (tudo muito rápido, não estava mais acostumada a isso, ainda mais depois de ser apresentada à plataforma SPSS), caiu a ficha: percebi que o mundo tinha mudado - estava bem mais rápido - e eu teria de me puxar (e muito) pra acompanhar o ritmo deles e não ficar pra trás.

Minha turma na escada da universidade, colegas que se tornaram amigos pra vida, e que jamais esquecerei: Marcelo, Sheila, Karina e Douglas, aprendi muito com vcs! Essa selfie do Doug foi no nosso último dia de aula em 2015, os sorrisos eram de felicidade e puro alívio pelo fim das aulas, provas, etc (minhas olheiras não negam...)


 
Terminadas as disciplinas, cada um de nós voltou ao Brasil com seus próprios desafios a vencer, objetivos a cumprir e uma dissertação inteira pra escrever, tendo o orientador à distância. Volta-se para Portugal em até 2 anos para a defesa (optei por voltar 1 ano depois). Quem vai fazer mestrado no exterior e não pretende morar lá por mais do que um ou dois meses, pode optar pelo regime intensivo, onde se cursam as disciplinas presenciais obrigatórias no período de férias de verão das universidades (julho e agosto). Existem muitos estudantes brasileiros fazendo isso em Portugal, pela facilidade do idioma e também porque o país é muito acolhedor, impossível não se sentir em casa.

No studio de TV da universidade, com um de nossos professores.
Os portugueses têm fama de ranzinzas, mas é só no primeiro momento: assim que criam uma certa intimidade, tal impressão logo se desfaz e vemos que são gentis, hospitaleiros e muito engraçados, de um tipo de humor mais sutil, diferente do nosso. Somos mais debochados e escrachados, fazemos piada de tudo, algumas sem graça nenhuma. As de português, por exemplo. Eles detestam.#ficaadica.
Faz sentido. Esse povo é muito mais formal e respeitoso, enquanto os brasucas já invademchegam criando intimidade e fazendo estardalhaço, é o nosso jeito. Eles estranham mas logo se acostumam e retribuem nos conquistando pelo estômago, com fartura e amor. Quem já foi convidado a comer e beber na casa de uma família portuguesa, sabe do que estou falando. Os portugueses cozinham muito bem e valorizam seus ingredientes locais. Os vinhos merecem um post à parte. Os doces, só rezando. De joelhos.
Entretanto, na maioria das vezes, eram umas triviais latinhas de bacalhau com grão de bico que me salvavam do aperto. Infelizmente, nunca encontrei por aqui, mas meu orientador e sua esposa fizeram a gentileza de me enviar pelo correio no natal passado. Como não amar esses portugas?
Minha marca favorita, mas não a única. Preço: em torno de 1 euro, às vezes tinha promoção no super e saía tipo 90 cents - quando isso acontecia, eu estocava as latinhas, meu recorde foram 23 (sim, eu limpava as prateleiras!)- não, nem se compara à comida "de verdade", mas era prático, barato e quebrava um galhão...

Bem, eu já falei sobre o mestrado e sobre a experiência em terras lusitanas (sobre meu sumiço acho que ninguém percebeu, então vou abafar o caso). Precisei de tempo pra refletir, a volta é sempre complicada, até nos acharmos novamente. O mundo real anda enquanto estamos fora, não se pode esquecer. No virtual, tb é bom dar um tempo, até pra trazer outros assuntos aqui, além da moda, é claro. E antes que vcs perguntem, já respondo:
-Mestrado em quê? Ciências da Comunicação.
-Se a experiência foi boa? Melhor do que eu esperava.
-Que porra é essa de SPSS? Pois é, nem queiram saber (eu vinha de outra área, nunca tinha mexido nisso) mas basicamente é um software que usa estatística, dentre outras análises, pra transformar dados em informações, muito usado em pesquisa de mercado. Esta foi a matéria do primeiro dia de aula e eu já surtei de cara, lógico.
-Se já consegui revalidar o título de mestre no Brasil? Ainda não, mas estou em processo de.
-Como fiz pra ir estudar lá? Eu descobri o curso aqui

Mais questionamentos? Estou à disposição!
Obrigada e até a próxima.